sexta-feira, 29 de maio de 2009
Arrigo Barnabé e a Banda Sabor de Veneno - Clara Crocodilo (1980)
Ao final da década de 70, o Brasil tinha o cenário musical perfeitamente estabilizado. A guitarra elétrica e o rock já não surpreendiam nem chocavam mais ninguém (talvez o punk e o heavy metal o fizesse, mas o movimento ainda era insignificante no país). Por outro lado, no exterior as coisas estavam pegando fogo. O underground europeu fervilhava de grupos irrequietos, que buscavam fazer uma “nova música”, livre das convenções musicais impostas pelo mercado fonográfico.
O underground brasileiro, coitado, só abrigava hippies, pseudo-intelectuais e pretensos rockers, numa cultura de esoterismo e rebelião equivocada – que no fundo era acomodação. Como a música “livre” poderia surgir neste ambiente? Veremos que realmente não surgiu.
A música de "vanguarda", como alguns costumam denominar, surgiu, no Brasil, em conservatórios e universidades, onde os músicos adquiriam uma preciosa carga de conhecimento teórico aliada a uma vasta cultura auditiva, somados, naturalmente, à realidade e à originalidade brasileira. É nesse caldeirão de possibilidades que emerge o pianista Arrigo Barnabé, sensível aos rumos que a música tomava e que poderia tomar. Em finais da década de 70 é reunido um grupo musical em torno de suas composições: a Banda Sabor de Veneno.
Após algumas experiências em festivais de música pelo Brasil, o grupo consegue gravar seu álbum: Clara Crocodilo, lançado no esquema independente que começava a surgir no país. A capa apresentava um singular desenho de cabeça de crocodilo e título do álbum escrito em sangue, no melhor estilo black metal. A performance do grupo também era atípica: todos vestidos em roupas listradas de presidiário, exceto as vocalistas, caracterizadas como “vampiras/barangas” de esquina. Destaco o próprio Arrigo Barnabé, uma criatura de aparência repugnante, cabelos ao alto e olheiras profundíssimas.
O som: atonalismo, samba, free jazz, Zappa, R.I.O., minimalismo... e até mesmo alguma pitada de rock. De início – e isso é quase inevitável – fixamos a atenção nos vocais. Vozes femininas em tonalidades altíssimas, ora solando, ora em coro, dialogando com a voz satírica e demonesca de Arrigo. Que fique claro que são arranjos vocais da mais alta complexidade, onde os diálogos e a narrativa se encaixam de forma perfeita no arranjo instrumental. E esse não fica atrás em complexidade. Liderados pelo piano frenético de Arrigo Barnabé desfilam diálogos atonais entre os diversos instrumentos de sopro, sustentados pela segurança da base baixo/guitarra/bateria.
Para completar, as letras. Por entre gírias e onomatopéias, desfilam histórias de chinfra e malandragem, prostitutas, chanchadas, fliperamas, chacretes, comerciais de TV, vilões mutantes... é a realidade do Brasil pobretão na linguagem ágil dos quadrinhos. Sim, Clara Crocodilo renderia uma excelente HQ. E sem medo de ser exagerada, porque não dizer um filme ?
1.Acapulco Drive-in
2.Orgasmo Total
3.Diversões Eletrônicas
4.Instante
5.Sabor de Veneno
6.Infortúnio
7.Office Boy
8.Clara Crocodilo
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6 comentários:
Fiquei curioso pra ouvir o que vou encontrar nesse disco,já ouvi falar dda genialidade de Arrigo Barnabé,mas confesso que não conheço nada de sua obra...baixando.
Bela resenha Laís...beijo e me liga,viu?
Clássico da vanguarda paulistana. Desse maluco aí tenho tudo e aconselho ouvirem tudo.
Belo post, Laís.
}{ões
Pois é, o londrinense manda vê...assim como seu companheiro, também "maldito", Itamer Assumpção.
Cara...esse disco traz como integrante da Banda Veneno o grande saxofonista Nivaldo Ornellas.
Laís, "você está mesmo fatal....Juro que eu nunca imaginei"...hehehe...pois mandou muito bem nesta postagem.Este álbum de Arrigo Barnabé e banda Sabor de Veneno se tornou um marco da Vanguarda Paulistana, tenho um exemplar em vinil...Vânia Bastos fazia backing na Sabor de Veneno com a Tetê (!?)...
Exato Big Clash, é sim a Tetê.
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